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SERGIO BARZAGHI/GazetaPress |
Regiani Ritter iniciou como atriz, fez cinema e novelas, mas foi em 1980 que entrou para o time dos jornalistas e se destacou como a primeira mulher reportagem esportiva e a cobrir uma copa do mundo.
Regiani Ritter iniciou sua carreira como atriz, no filme “Ninguém segura essas Mulheres”, logo após participou de telenovelas na TV Tupi e SBT. Mas foi em 1980 que ela entrou para o time de jornalistas, tornando-se parte da equipe da Rádio Gazeta. Regiani se destacou por ser a primeira mulher a exercer a função de repórter esportiva e também a primeira a cobrir uma copa do mundo.
Ao longo dos anos, tem se tornado referência nos meios esportivos e em 2010 foi homenageada pela ACEESP, que colocou o seu nome, em um Troféu que a cada ano prestigia uma mulher que se destaca no jornalismo esportivo, o Troféu Regiani Ritter.
Regiani quando você recebeu a notícia de que seria premiada e que o Troféu receberia o seu nome, qual foi a sua reação?
Eu estava no estúdio do ar, o Erick Castelheiro e a Michele Gianella, da ACEESP da TV Gazeta e da GNET entraram, esperaram dar intervalo e então perguntaram: podemos dar seu nome a um troféu FORD ACEESP para premiar a mulher que se destacar no jornalismo esportivo anualmente? Eu olhei pra cara deles ver se estavam brincando, não estavam. Eu acreditei, e chorei. Voltou do intervalo e eu tentava disfarçar, mas não dá né? Era tudo que eu não esperava, era o sonho que eu não sonhei. Muito lindo!
Como foi suar a camisa, numa época que Mulher em campo era alvo de preconceito, principalmente por estar dentro dos “territórios masculinos”?
Tomava chuva, choque de microfone, sol de 35º graus, levava pedrada que não era pra mim, pedrada que era pra mim, escutei em forma coro xingamento de torcida (mas isso foi uma vez só, o bastante), tive que bater de frente com segurança que não me deixou entrar no vestiário do Guarani em Campinas, (chamei o presidente do clube e entrei), levei cantada de jogador e treinador, (era obrigada a recusar, mesmo tendo vontade de conversar mais demoradamente com um ou outro), me pediram pra sair de um vestiário (o do São Paulo) que eu frequentava há mais de ano. Não folguei sábado, domingo ou feriado durante 15 anos. Mas valeu a pena, como valeu!
As dificuldades partiam apenas da sociedade ou também de atletas e dirigentes?
Com atletas, comissão técnica e dirigentes não tive problemas, foi surpreendente a facilidade com eles. Episódios isolados envolveram seguranças, um conselheiro, alguns poucos torcedores, e alguns poucos “coleguinhas”!
Teve alguma equipe que foi mais arredia com você?
Não, nos clubes o tratamento foi igual, todos me receberam bem. Acho que o fato de ter apresentado o “Jornal do Esporte” na TV Gazeta, com Kleber Machado e Roberto Avallone, logo de cara, me deu suporte. Apresentei também o “Record nos esportes” na TV Record, e fiz durante bons anos o “Mesa redonda” na TV Gazeta onde era comentarista. Além da seriedade sem chatice, eu tinha muita sorte, ou intuição, nos palpites. Isso tudo ajudou bastante quando eu ia para os treinos, jogos e viagens.
Como era o comportamento dos jogares e das equipes, houve algum tipo de assédio?
Assédio não, porque eles me respeitavam muito, acabava até fazendo amizade com mulher de jogador, por força do trabalho. Mas cantada houve sim e confesso que teve hora que balancei, mas não podia ceder. Esse meio não perdoa, e eu estava decidida a vencer. Era uma coisa ou outra. Escolhi a profissão.
Qual foi o fato mais curioso dos tempos de reportagem?
Não diria curioso, mas chato. Eu estava em rádio, e era setorista do Palmeiras. O contrato de cogestão Palmeiras-Parmalat, inédito no futebol brasileiro, caiu no meu colo, através de uma pessoa que gosto muito. Era o furo do ano, ninguém sabia, e ela me deu todos os pormenores, com nome e tudo. Por pura intuição de que era real, comecei a dar a noticia numa jornada que ia transmitir exatamente um jogo do Palmeiras. A massa caiu em cima de mim, amigos de jornais principalmente, de TV’s e rádios queriam saber de onde, como e porque, eu continuei dando detalhes de como seria por uns três dias, e aí a diretoria do Palmeiras reuniu a imprensa e disse claramente que o anuncio seria dali a 15 dias, mas que uma jornalista xereta tinha descoberto e contado, então eles apresentaram os parceiros, e itens do contrato, que batiam com tudo o que eu dei.
Dias depois, meu narrador disse em programa que o furo de reportagem era do nosso comentarista, que não desmentiu e disse apenas: “meu e da Regiani Ritter”. Quase caí de costas, afinal, dei minha cara pra bater, se fosse rebate falso era fim de carreira. E ai vem alguém e me tira o mérito, foi ai que eu senti a barra pesar, por que era o meu narrador e meu comentarista, da mesma emissora!
Conte sobre a situação que você passou ao entrevistar o Casagrande, no vestiário?
Devo muito ao Casão, a primeira vez que entrei num vestiário ainda não tinha sido liberado nem para os masculinos, e era homem nu pra todos os lados. Quando me viram, o filme acelerou passos apressados, corridos, mãos na frente, mãos atrás, e em segundos eu estaria sozinha no vestiário, não fosse o Casagrande, que ficou na dele, pelado, como se eu não estivesse ali. Me armei de coragem e pedi uma entrevista, “você fala comigo?” ele: “falo sim, você espera eu tomar uma injeção?” veio o Dr. Marco Aurélio Cunha, baixinho, o Casa subiu no banco de madeira, o medico aplicou a própria, ele desceu, e disse estar à disposição. Eu não sabia se ria ou chorava, (risos), não fiz nenhuma das duas coisas. Só fiz a entrevista que era ao vivo e agradeci. Valeu casão!
Há alguns anos longe dos campos, você sente vontade de voltar?
Sinto saudade, mas vontade de voltar, não. Até porque essas malditas coletivas acabaram com a liberdade do jornalista. Hoje ligo o rádio, a TV, leio o jornal, vejo a internet, é tudo igual! Sempre os mesmos caras falando as mesmas coisas, talvez por isso os repórteres não exerçam sua criatividade, e dá raiva às vezes.
Em 30 anos de carreira, quais foram suas maiores realizações?
Cobrir a seleção brasileira nas eliminatórias de 1993 foi 84 dias respirando seleção. A Copa do Mundo de 1994 nos Estados Unidos, 55 dias, e foi quando saímos de um jejum de 24 anos sem títulos, era o Tetra! Entre outras homenagens, que me surpreendiam muito, como ser eleita a melhor jornalista esportiva de 1991, pelo jornal Unidade, do Sindicato dos Jornalistas, quando realizei um sonho em fazer rádio, TV e jornal tudo ao mesmo tempo, na área de esportes, especializada em futebol. Até que um coleguinha me disse: “você foi escolhida a melhor, que legal! Mas não há nada a comemorar, você foi eleita a melhor repórter feminina e só tem você!”.
Ele foi longe demais, e respondi de imediato, “Não existe nada pior do que um jornalista mal informado, eu fui escolhida entre seiscentos homens, inclusive você”. Depois até achei que fui muito dura com ele, mas eu queria que você visse a cara dele quando falou que eu ganhei de ninguém, era ironia pura, era uma gozação só, então como era provocação, não aguentei!
Falta algo para você realizar?
Sempre falta, quando a gente fala que fez tudo é porque o tempo está vencendo, na vida. Eu tinha um programa na radio Gazeta, “A PARADA DO CRAQUE” que entrevistava gente do esporte falando de tudo, menos do esporte. Era política, teatro, cinema, música, medicina, drogas, sexo, gostos pessoais, superstições, religião, literatura, enfim hoje eu gostaria de fazer o mesmo programa na TV, algo semanal ou coisa assim. Mas ainda vou pensar nisso com carinho.
Hoje o espaço para as mulheres no futebol e no esporte é bem maior. Dentre as jornalistas da atualidade, qual você considera bastante capacitada para se tornar ícone neste segmento?
É difícil citar nomes, até porque não sei todos, mas conheci uma repórter há alguns anos que tinha tudo pra ser referencia, a Luciana Mariano, de Campo Limpo Paulista, ela veio para a radio a meu convite, mas no caminho acabou se transformando em Luciana do Valle, casou com o Luciano e sumiu.
Aqui da nossa faculdade saiu a Natalie Gedra, que fez estágio comigo e me disse, ”quero ser você quando crescer!”, respondi que ela chegaria mais longe do que eu tinha chegado, pelo talento natural. A Natalie já foi premiada a revelação de 2009, é muito inteligente, boa no que faz, e tem tudo pra ser ícone. Vai depender só dela.
Entre as que ficaram amigas, Kitty Baliero, Abigail Costa, são pessoas e profissionais incríveis. Isabel Tanese, Lia Bentchen, Fernanda Factori, Débora Menezes, Mariana Godói, que depois se bandeou pra ancorar jornais na Globo, Renata Fan, que hoje estrela na Band.
Fatalmente, vou esquecer alguém, tem muitas mulheres nos bastidores, produção e tudo o mais, como a Elo Campanholo, que eu levei pra Gazeta, hoje está na TV Record, já viajou o mundo. É um universo grande, cuja tendência é crescer ainda mais.
Quais profissionais lhe serviram de inspiração?
Eu ouvia rádio e via TV, lia tudo pra me inteirar de tudo, mas principalmente do esporte. E não gostava de todos, não. Mas ficava por perto de Luiz Carlos Quartarolo, Wanderlei Nogueira e outros bons pra aprender a mecânica da coisa toda, sou caipira, mas não sou modesta, sabia que tinha personalidade forte pra ser um estilo x, então não buscava em quem me inspirar, buscava apenas por gostar.